África – China: Está o Continente pronto para uma parceria verdadeiramente estratégica?

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João Carlos, Editor “O.Economico” e Anchor “Semanário Económico “

À medida que a China e a África se preparam para o Fórum de Cooperação China-África, que se inicia amanhã em Pequim, o contexto das relações entre os dois parceiros é marcado por um misto de oportunidades e desafios. Esta cimeira de três dias, que reunirá líderes de cerca de 50 países africanos, simboliza um momento crucial na trajectória das relações sino-africanas, num cenário global em rápida transformação.

China e África: Um relacionamento estratégico em evolução

Desde que Xi Jinping assumiu o poder, a China tem procurado posicionar-se como um parceiro fundamental do continente africano, não apenas no âmbito económico, mas também no diplomático e político. A iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”, lançada há uma década, financiou um boom de infra-estruturas em África, permitindo que muitos países acelerassem o seu desenvolvimento em áreas como transportes, energia e comunicações.

Contudo, o mundo mudou, e as circunstâncias em torno dessa relação também. O abrandamento da economia chinesa e a crise no sector imobiliário têm gerado tensões internas em Pequim, limitando a sua capacidade de continuar financiando projectos em larga escala no exterior, incluindo em África. O próprio modelo de empréstimos generosos que a China ofereceu aos países africanos nos últimos anos enfrenta crescentes críticas, especialmente diante do aumento da dívida de muitos governos africanos, como os da Zâmbia, Etiópia e Gana.

Oportunidades de parceria: Infra-estruturas e Energia Verde

Apesar dos desafios, o relacionamento sino-africano continua a oferecer oportunidades notáveis. A China está a reposicionar-se como parceira chave na transição energética em África, especialmente no apoio ao desenvolvimento de fontes de energia renováveis, como a energia solar e eólica. O continente, ainda profundamente afectado por problemas de fornecimento energético, tem muito a ganhar com as tecnologias chinesas, que são mais acessíveis e adaptadas às suas realidades.

Além disso, o foco da cimeira em Pequim deverá estar na reestruturação da relação comercial entre a China e a África. Hoje, a balança pende muito para o lado chinês, com um superavit comercial recorde de US$ 64 biliões em 2022, fruto da exportação maciça de produtos manufacturados para o continente. Para que o relacionamento seja sustentável, a África precisará encontrar maneiras de aumentar o valor agregado das suas exportações, reduzindo a dependência de matérias-primas e aumentando a produção industrial local.

Fardo da dívida: Um desafio emergente

Embora o Fórum ofereça uma plataforma para discussão e avanço, uma questão sensível estará no centro das negociações: a dívida. Durante a última década, os empréstimos chineses financiaram grandes obras de infra-estruturas em África, mas a pandemia e o abrandamento das economias locais pressionaram muitos governos africanos a pedir alívio ou perdão da dívida. A relutância de Pequim em oferecer perdões e sua preferência por reescalonar os pagamentos pode tornar-se uma fonte de atrito durante a conferência.

Por outro lado, alguns países africanos estão a rever o valor estratégico desses empréstimos. A preocupação crescente com o impacto da dívida e com a falta de investimentos que gerem empregos locais levou líderes como o presidente sul-africano Cyril Ramaphosa a pedir à China por uma relação mais equitativa e por investimentos que tragam benefícios a longo prazo para as economias africanas.

Influência diplomática: Um Jogo geopolítico

No campo diplomático, a China tem avançado com sua estratégia de expandir sua presença e influência no continente africano, numa tentativa de desafiar a ordem mundial liderada pelos EUA. A relação entre a China e a África vai além da economia, incluindo também fortes laços políticos, visíveis nas votações africanas na ONU em favor das posições de Pequim em questões como o Tibete, Xinjiang e Hong Kong.

A crescente presença diplomática da China em África, com mais embaixadas no continente do que os EUA, reforça a importância que Pequim atribui a esta parceria estratégica no Sul Global. À medida que o mundo se torna cada vez mais multipolar, a China está a utilizar a África como uma plataforma para expandir sua influência, ao mesmo tempo que os países africanos beneficiam desse novo equilíbrio de forças globais.

Um futuro de cooperação ou de divergência?

A cimeira em Pequim oferece uma oportunidade para ambas as partes recalibrarem as suas expectativas e alinharem interesses. Enquanto a China luta com suas próprias limitações económicas, os países africanos precisam de mais do que infra-estruturas: precisam de uma relação comercial justa, de investimentos que criem empregos e de uma estrutura de dívida que permita crescimento sustentável.

Este Fórum pode ser o momento de viragem nas relações China-África, caso as discussões avancem para parcerias mais equilibradas, baseadas no fortalecimento das economias africanas. Se Pequim e os líderes africanos conseguirem ajustar suas prioridades, essa parceria poderá continuar a ser uma força motriz do desenvolvimento do continente nas próximas décadas.

No entanto, se as tensões sobre a dívida e o desequilíbrio comercial persistirem sem resolução, o relacionamento poderá enfrentar novos desafios. África, com sua crescente importância geopolítica, terá de decidir qual será o papel da China em seu futuro, equilibrando a influência de Pequim com a necessidade de garantir soberania económica e políticas de desenvolvimento inclusivo.

Em última análise, o futuro das relações China-África dependerá de como os líderes de ambos os lados abordarem essas questões centrais durante a cimeira em Pequim. O mundo estará atento.

Fonte: O Económico

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