Quando mergulhamos na contemplação do sofrimento das almas eclipsadas pela sinfonia soturna da pólvora, nas teias da sociedade envolvida num eterno lamento de miséria, onde a alma humilde muitas vezes suplica pelo término da produção bélica, consciências despertas tecem pensamentos vigilantes, testemunhando o sofrimento das massas e a devastação do planeta pelas cinzas das forjas bélicas. As ondas fumegantes do conflito escravizam e envelhecem o manto do ozono, embora sejam tecidas para ornamentar o diagrama financeiro e enriquecer os cofres dos fabricantes.
As armas, que forjam rios de chumbo a banhar o peito humano, diluindo as células da alma em cálices de morte, deixam as aldeias desfavorecidas desprovidas de alegria e da vontade de existir. Urge transcender o medo e buscar a coragem que extingue a fábrica de armamentos, conduzindo o mundo à celebração do baptismo no Rio do Amor, da Paz, da Paixão e dos Prazeres Benevolentes. Talvez seja necessário despertar a consciência para a compreensão de que a arma é o reflexo natural do espectro da morte e do sofrimento.
Sim, o olhar perspicaz detecta nas tintas da guerra cores análogas às das indústrias bélicas que movem oceanos em troca de semblantes de dólares. A padronização da produção de instrumentos letais encobre o destino de vidas inocentes, com a dança macabra de projécteis bélicos que acariciam com a morte o peito desprotegido dos menos afortunados.
Os versos da poesia da guerra mesclam-se às nuances do neocolonialismo engendrado pelas nações opulentas, disfarçadas de auxílio sob pretexto, perpetuando a eterna dependência dos países menos favorecidos, minando a inteligência dos seus líderes e, muitas vezes, usurpando o desenvolvimento das sociedades ao pilhar os seus recursos naturais sem retribuir benefícios directos ao povo, ou impondo políticas que limitam a sua exploração e comercialização, obstaculizando, assim, o avanço desses países.
Os versos da poesia da guerra confundem-se com a claridade do segredo que embriaga as consciências, levando-as a proferir “sim” ao que é “não”, em todas as teorias que não se traduzem em benefícios para as nações menos favorecidas. Às vezes, os versos dessa poesia tomam a cor dos que buscam riqueza, sacrificando a alma dos desprotegidos, esquecendo-se de que todas as almas, sejam elas envoltas na penumbra da opulência ou no fulgor da penúria, enfrentarão a mesma experiência derradeira, o mistério oculto além da morte. Sim, a guerra veste-se com as cores da morte, enriquecendo as nações que olvidam que nenhum povo, de qualquer nação, escapará à experiência do transe final.
Os versos da poesia da guerra ecoam nos gritos das crianças que se escondem nas matas [do Leste da RDC, do Norte de Cabo Delgado, na Faixa de Gaza, na Ucrânia, Burkina Faso, Sudão, Iémen, Síria…] sempre que os seus ouvidos se deparam com o estrondo do cano das armas, cuja produção gera mortes e a miséria de almas desprotegidas, enriquecendo, por outro lado, as nações produtoras de armamentos. O processo de fabricação de armas talvez participe, de maneira dissimulada, na degradação e destruição da mãe natureza.
A imagem da guerra está imbuída do egoísmo e da máscara da benevolência, que buscam restringir o progresso dos países menos favorecidos, impondo-lhes o jugo do sofrimento, da pobreza e das limitações. A guerra assume as cores das nações abastadas, que continuam a exportar políticas que impedem o avanço das sociedades carentes, aproveitando-se da falta de discernimento dos líderes destituídos de luz para direccionar os valiosos recursos existentes, incapazes de vislumbrar caminhos que libertem as suas nações do jugo do subdesenvolvimento humano.
A poesia da guerra reflecte-se nas cores das armas que ceifam prematuramente as almas do povo pobre. Reflecte-se nas tintas que não pincelam o mundo com traços de amor e cenários de benevolência, mas glorificam a riqueza das nações desenvolvidas com o clamor da guerra e o gemido das almas pobres, sem que as organizações humanitárias do mundo se interessem em discutir temas que desestimulem a produção bélica. Hoje, discutem-se exaustivamente as energias fósseis, talvez porque o progresso dos países menos favorecidos esteja ligado à exploração e comercialização desses recursos, algo que poderia abalar a arrogância e prepotência das nações que ditam as regras do jogo global.
Os resultados financeiros da indústria bélica tornam-se mais positivos quanto maior for o consumo de vidas ou o número de vidas ceifadas. O marketing da morte embriaga as consciências compradoras de armamentos, semeando o desespero numa existência que deveria ser pautada pela esperança de viver num mundo justo.
Precisamos de uma mobilização social para resgatar o mundo das garras das armas e secar o rio de lágrimas vermelhas que fertiliza a indústria bélica e os seus acessórios. Precisamos de um esforço colectivo para tecer a paz com as letras da poesia, num mundo bom para todos. Os países pobres não devem mais ser forjados como campos de batalha geneticamente ocidentais; eles precisam de desvendar o véu que esconde as armas e o fardo económico das mãos que oferecem ajuda sob uma falsa aparência de generosidade.
Deus livre o pobre do consumo de armas!!!
Fonte:O País