Por: Mbututu Kwezani
Dra. Inês – Este aqui é paracetamol, o senhor deve tomar três vezes ao dia (de manhã, à tarde e à noite). Faça o mesmo com estas cápsulas, está bem, Papá?
Sr. Muianga – Nada! Eu não vai levar, todos dia quando vem aqui vocês só me dá p’rastamol com cápsula… Não me faz anál’se nem não dá rede mosquite’ra, como que vai curar malária dele?
Dra. Inês – O senhor devia agradecer por esses comprimidos. Eu ganharia um bom refresco com eles, já que o salário que me pagam nem serve para um saco de arroz. O senhor ainda quer reclamar…. Haja paciência!
Sr. Muianga – Já não se faz médico como de muinto tempo, os bons médico que restou perde respeito por causa de vossos comportamento.
E foi aos murmúrios que o Sr. Muianga abandonou o centro de saúde. Mais uma vez não tinha gostado do atendimento, “muinto muinto daquelas doutora que só fica no telefone”, dizia o velho.
Já somavam meses e vezes que este visitava o centro de saúde, mas o caso de sua malária jamais fora resolvido. Naquela tarde, Muianga murmurou o caminho todo voltando para casa, “dessa vez é de vez”, dizia ele. Depois de duas horas de caminhada, Muianga chegou ao bairro.
Já mesmo à entrada de casa, ouviu as vizinhas falando do grande hospital no centro da cidade, que este era bom e o atendimento era dos melhores…. Posto isto, Muianga não aguardou o fim da conversa. Entrou logo em casa, todo eufórico. Era como se aquelas palavras abluíssem seu coração de toda a raiva que trazia do centro de saúde. Os termos e condições para o dito bom atendimento, são muito altos, diziam as vizinhas concluindo a conversa. Mal sabia o Sr. Muianga.
No dia seguinte, os passos de Muianga é que despertaram os galos, pois este tinha-se levantado muito antes do cantar destes. Apanhou o primeiro autocarro e, lá se foi em direcção ao grande hospital que, por sinal, era público. Quando lá chegou ficou babélico pois havia uma grande bicha de doentes. Um mais grave que o outro, entre os quais, mulheres grávidas, idosos e até crianças. Porém, este não foi o motivo que o deixou ababelado, o facto é que, enquanto uns permaneciam numa bicha que muito pouco andava, outros entravam e saíam com suas questões sanitárias resolvidas.
Ao longo das quatro horas seguintes, o ciclo foi-se refazendo, mais uma vez, mais uma e mais outra. Sr. Muianga e os outros doentes não eram atendidos. Continuavam ali, nos bancos de espera vendo outros passando à frente. Cansado daquela pouca-vergonha, Muianga dirigiu-se à sala que ficava no final do corredor, cuja escrita na porta anunciava “gabinete do director”, lá onde pairavam os sopros do ar condicionado a 18°. Sem pedir licença, Muianga entrou no gabinete, vociferando reclamações instantaneamente. Por sua vez, o director, Dr. Malini, convidou Muianga a sentar-se, mas este recusou o convite e continuou reclamando o mau atendimento. Momentos depois, ouviram-se batidas na porta e, de seguida, entrou o médico-cirurgião trazendo boas notícias ao director:
Dr. Sebastião – Doutor, o paciente 77 mandou confirmado e já aguarda na sala de cirurgia, podemos começar?
Dr. Malini – Apague a mensagem do confirmado e comecem imediatamente. Ligue os novos equipamentos. Deves ser tu a tratar deste paciente, ele é um dos melhores pacientes que temos.
Então, Sebastião pôs-se a limpar o campo de mensagens e logo que terminou disse:
Dr. Sebastião – Está feito, Doutor, o campo de mensagens assim como o campo de reciclagem estão totalmente limpos, como pediu, “um deserto sem viajantes, Doutor, em momento algum tem pegadas.”
Dr. Malini – Óptimo, agora vá, cuide do nosso paciente V.I.P.
Então, dr. Sebastião, o médico-cirurgião, retirou-se de imediato.
Muianga levou a mão à testa, acenou negativamente a cabeça e no seu íntimo, invocou os seus: “Vaka Muianga”, pois ficou pasmado com a conversa dos dois técnicos e, antes mesmo que proferisse palavra alguma, o Dr. Malini disse-lhe:
– Vês, meu senhor, nós fazemos de tudo para cuidar dos nossos melhores pacientes, porém, como o senhor viu “o nosso maior valor não é a vida”.
Sr. Muianga nada mais respondeu, a frieza de Fortunato Malini, director geral do grande hospital, lhe trouxera um nó na voz que reclamava bom atendimento e assim foi, de nó a nó que se calou continuamente a voz do “Madala Muianga”, como era vulgarmente conhecido Vicente Muianga.
Depois daquele dia, Muianga não mais voltara ao hospital, a sua malária tinha piorado de forma tão agravante que a pontuação colocou um ponto final em sua vida. A notícia da sua morte tanto assustou a vizinhança que de imediato chamou os serviços do grande hospital da cidade e, este por sua vez, mandou uma ambulância depois de quatro horas, então vi naquela viatura hospitalar uma escrita a cor de sangue, vermelho, levava embora para sempre “Madala Muianga”,
“O Nosso maior valor não é a vida”. Informava a escrita na viatura.
Nota do autor:
O texto acima apresenta erros de concordância nas falas do personagem “Muianga”, isso deve-se ao facto de ser este o individuo com baixo nível de escolaridade.
Fonte:O País