Teste de stress de bancos africanos revela riscos sistémicos decorrentes de perdas ecológicas

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Um teste de stress a cinco sistemas bancários africanos revelou que alguns credores da região poderão entrar em colapso se as perdas decorrentes da natureza reduzirem os lucros das empresas agrícolas e florestais às quais concederam empréstimos.

A análise realizada na Zâmbia, no Gana, no Ruanda, em Marrocos e nas Maurícias revelou que as empresas de determinados sectores poderão ver os seus lucros reduzidos para metade nas próximas duas décadas se impactos como a desflorestação e a perda de polinizadores como as abelhas continuam a ser ignorados.

“A África depende da natureza… se não nos coordenarmos em termos de como estamos a lidar com os riscos que vêm da natureza, das alterações climáticas, podemos começar a ver alguns riscos sistémicos e efeitos de contágio no sector financeiro em África”, disse à agência Reuters, Oswald Mungule, analista sénior do Banco da Zâmbia que participou no estudo.

O aviso surge antes da conferência da ONU sobre biodiversidade COP16, a realizar na Colômbia em Outubro, onde os líderes mundiais estão sob pressão crescente para evitar uma maior destruição dos principais ecossistemas.

O novo teste de stress, partilhado em exclusivo com a Reuters, é o primeiro desde o acordo global alcançado na COP15, em Toronto, em 2022, a analisar o grau de desestabilização económica da perda de biodiversidade.

O Fórum Económico Mundial estima que cerca de dois terços da produção económica de África dependem muito ou moderadamente do ambiente natural.

Os testes de resistência, coordenados pela Aliança Africana do Capital Natural (ANCA), em conjunto com a agência de desenvolvimento britânica FSD Africa e a empresa de consultoria McKinsey, mostraram que os sectores da agricultura, da exploração mineira e da alimentação são os que enfrentam os maiores desafios.

Se pouco for feito nos próximos 25 anos, as empresas agrícolas do Gana e as empresas mineiras da Zâmbia deverão sofrer uma queda de 50% e 32%, respectivamente, nos seus lucros, criando ciclos de feedback negativo para os bancos.

“As perdas de crédito esperadas cumulativas (nos cinco países) poderão aumentar até 21% até 2050 se não forem tomadas medidas positivas para a natureza”, afirmou à Reuters, Dorothy Maseke, Directora da ANCA e FSD Africa Nature Lead. “É um quadro muito negro”. Acrescentou.

 

Problemas à frente

Mungule, funcionário do banco central da Zâmbia, também ouvido pela Reuters, explicou que outro grande problema é o risco de escassez de alimentos, que a história mostra que faz subir a inflação e as taxas de juro.

De acordo com a Reuters, uma seca severa na Zâmbia no ano passado levou a um aumento dos preços dos alimentos, que representam mais de 50% do cabaz do IPC do País. Acrescenta que, para além de uma crise da dívida nacional que só agora está a ser resolvida, isto significa que quase 14% dos empréstimos que os bancos comerciais da Zâmbia concederam a empresas agrícolas e florestais são agora “não produtivos”, um número que deverá aumentar.

A agricultura contribui tradicionalmente com menos de 4% do PIB da Zâmbia, de acordo com os dados do FMI, mas o sector mineiro, que o estudo advertiu poder sofrer uma queda de mais de 30% dos lucros nas próximas décadas, tem uma quota muito maior, de 17,5%.

Para tentar limitar estes problemas, o banco central da Zâmbia está a pressionar para que sejam concedidos menos empréstimos a empresas mineiras e mais a empresas com actividades mais ecológicas e amigas da natureza.

O banco central quer também realizar regularmente testes de resistência ao clima no sistema bancário e está a candidatar-se à adesão à Rede de Bancos Centrais e Supervisores para a Ecologização do Sistema Financeiro (NGFS), acrescentou Mungule.

Maseke disse que a ANCA tem agora “memorandos de entendimento” com quatro países africanos, incluindo a Zâmbia, para ajudar na elaboração de políticas, e pretende apoiar oito no total até ao final do ano.

Os resultados dos testes de stress para bancos individuais não foram divulgados, mas avaliaram três cenários principais: um que pressupõe a ausência de medidas adicionais para fazer face aos riscos naturais e climáticos; um segundo em que os governos endurecem as regras, mas as empresas são lentas a agir; e um terceiro em que tomam medidas coordenadas em conjunto.

Se as empresas conseguirem reduzir o seu impacte na natureza e ajustar os preços em resposta aos custos que enfrentam, o impacto nos lucros poderá ser entre 78% e 27% inferior, segundo o estudo.

Fonte: O Económico

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