Geração Z e Millennium: “gerações da viragem”?

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Esta é uma denominação que, nos últimos dias, se tornou muito referenciada na media internacional e nos corredores políticos globais. Mas o que isso significa? Literalmente, geração Z é um nome de um movimento de jovens quenianos nascidos de 1996 a esta parte, que clama por boa governação. Millennium seria a geração anterior à Z, isto é, a geração de 1981 a 1996. Estas duas gerações perfazem quase 60% da população queniana. Há quase um mês, o movimento ocupou as ruas de Nairobi e de outras cidades, contra um projecto de lei que incluía o aumento de impostos no país. Os protestos que culminaram com a morte de cerca de 40 pessoas forçaram o Presidente do país, William Ruto, a recuar/desistir da implementação do projecto. Antes da decisão, Ruto tinha-se mostrado, nos primeiros dias das manifestações, inflexível. Entretanto, os Gen Z não arredaram o pé e continuaram com os protestos que acabaram com a invasão do parlamento. Para além das ruas, o movimento popularizou-se também nas redes sociais, sem líderes. Os jovens foram à rua movidos pelo mesmo sentimento e causa comum: dar um “basta”.Gen Z: um fenómeno novo?Estes movimentos de revolução não são novos. Na história da humanidade e das democracias, podemos encontrar vários exemplos de movimentos de jovens que provocaram mudanças importantes na configuração sociopolítica. Em 1908, o mundo testemunhou a Revolução dos Jovens turcos que exigiam a reabertura do parlamento que havia sido suspenso em 1878. Os protestos deste grupo, que se prolongaram até 1928, forçaram o sultão, Adbulhamid I do Império Otomano, a reabrir o parlamento.Nos anos 1960 a 1970, o mundo vivenciou vários outros movimentos juvenis, nos Estados Unidos (Movimento dos Direitos Civis), França (revolução estudantil — 1968), China e até na antiga URSS, hoje Rússia. Todos estes eventos históricos tiveram jovens e adolescentes na dianteira, que estavam ávidos por ver os seus problemas resolvidos e mudar o status quo dos poderes políticos de então. No continente africano, também houve muitos movimentos de jovens que, mesmo sem o comando de líderes políticos, se fizeram ouvir. Na África do Sul, a 16 de Junho de 1976, cerca de 3000 a 10 000 estudantes saíram à rua contra o uso da língua Afrikaans em igualdade com o inglês nas escolas secundárias, na África do Sul, um processo que fazia parte do sistema segregacional do Apartheid. Nos últimos tempos, este fenómeno de protestos dos jovens tem vindo a ganhar espaço no continente. Ainda está na memória da maioria o fenómeno Primavera Árabe (em 2010), que culminou com várias mudanças de governos e constitucionais em muitos Estados africanos do Magreb. Em 2020, milhares de jovens levantaram-se na Nigéria contra a brutalidade da polícia, no conhecido por “EndSARS Moviment”. Na África Ocidental, a “Gen Z e Millennium” esteve ou está por trás das mudanças constitucionais que afectam aquela região, com os golpes de Estado no Mali (2020 e 2021), Guiné-Conacri (2021), Sudão (2021), Chade (2021), Burquina Faso (2022), Niger e Gabão (2023).O que a Gen Z quer?Provavelmente essa seja uma das perguntas que mais ecoa nos últimos dias, nos meandros do debate público e privado, quando o assunto é Gen Z e Millennium. Porém, independentemente da explicação que se possa tentar dar, uma coisa é clara: a juventude está cansada de líderes que não resolvem os problemas básicos da população. No Quénia, a juventude foi à rua para dizer “basta” o desperdício de recursos financeiros do Estado em viagens “desnecessárias” do Presidente Ruto e do seu Governo. Gritaram alto dizendo “basta”, contra as mordomias dos membros do Governo. “Basta” ao excesso de funcionários improdutivos nas instituições do Governo. Ademais, foram às ruas exigir auditorias das dívidas do Estado. Querem saber para onde vai o dinheiro. Dito tudo isso, os jovens estão simplesmente a dizer que querem fazer parte do processo de governação. Querem ser consultados sobre o rumo que o país está e deve seguir. Estes são tempos novos e de mudanças. Certamente, o mundo e o continente africano viverão muitas destas revoluções. Aliás, há quem já está a baptizar este fenómeno de “East Africa Summer”, o que significa “Verão da África Oriental”, num paralelismo à Primavera árabe. Pelo sim ou pelo não, a grande questão que se coloca é: até que ponto estão as lideranças dos nossos países africanos estão abertas a compreender estes fenómenos, sem arranjar bodes expiatórios?

Fonte:O País

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