Impacto das manifestações: empregadores recorrem à “força maior” para suspender contratos de trabalho

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As manifestações violentas que abalaram Moçambique nos dias 23 e 24 de Dezembro tiveram consequências graves para o sector económico e para os trabalhadores. Caracterizadas por vandalismo, pilhagens e destruição de estabelecimentos comerciais, estas acções geraram prejuízos avultados e colocaram milhares de moçambicanos em situações de incerteza e penúria.

A figura da “força maior” e a suspensão de contratos

Com o comércio severamente afectado, empregadores começaram a recorrer à figura jurídica de “força maior” ou “caso fortuito”, prevista no artigo 134 da Lei do Trabalho. O advogado Valdez Beleza explicou que este mecanismo permite aos empregadores suspender temporariamente contratos de trabalho sem a obrigatoriedade de pagamento de salários. “A vandalização e saque foram ocorrências imprevisíveis que afectaram a actividade, daí que o empregador pode suspender temporariamente os contratos, comunicando os fundamentos da decisão aos trabalhadores”, afirmou.

Beleza sublinhou que, embora a suspensão exima o empregador de pagar salários, mantém-se o dever de lealdade e respeito mútuo entre ambas as partes. No entanto, reconheceu que esta situação pode agravar a vulnerabilidade económica dos trabalhadores, muitos dos quais dependem exclusivamente do salário como fonte de sustento.

Trabalhadores: vítimas da lacuna legal

As manifestações também tiveram impacto directo na classe trabalhadora. Antes mesmo dos eventos de Dezembro, muitos trabalhadores enfrentavam dificuldades para chegar aos seus postos devido a barricadas e bloqueios rodoviários. Em resposta, algumas entidades empregadoras marcaram faltas injustificadas, gerando queixas e denúncias por parte dos afectados.

A lacuna na legislação laboral moçambicana torna esta situação ainda mais complexa. Segundo Paulino Cossa, especialista em direito laboral, que falou à Agência de Informação de Moçambique (AIM), a Lei do Trabalho não prevê a justificação de faltas por causa de manifestações ou greves. “Mesmo que a falta seja justificada, isso não implica obrigatoriamente o pagamento de salário, uma vez que este é uma contraprestação pelo serviço prestado”, explicou Cossa.

Propostas para mitigar o impacto

Diversos especialistas apontaram soluções para mitigar os efeitos destas situações excepcionais. Para Cossa, seria aconselhável que empresas com capacidade financeira continuassem a honrar os compromissos salariais, mesmo em casos de força maior. Já Egas Daniel, economista com experiência no sector privado, sugeriu uma intervenção mais activa do Instituto Nacional de Segurança Social (INSS). “O INSS deveria intervir em casos como este, cobrindo os salários dos trabalhadores afectados”, afirmou, defendendo também uma revisão da Lei do Trabalho para acomodar situações excepcionais como protestos e manifestações.

Impacto económico e o papel do Estado

As manifestações resultaram na perda de cerca de 15 mil postos de trabalho, o que agravou ainda mais a instabilidade económica e social do país. Para minimizar os danos, alguns especialistas defendem que o Governo deveria considerar decretar um Estado de Emergência ou de Sítio, permitindo a intervenção directa na manutenção de postos de trabalho através de subsídios às empresas.

A situação actual expõe a fragilidade das empresas e dos trabalhadores perante eventos imprevisíveis como as manifestações violentas. A necessidade de uma abordagem mais estruturada para proteger os direitos laborais e mitigar os impactos económicos torna-se evidente, exigindo acções coordenadas entre empregadores, trabalhadores e o Estado.

Fonte: O Económico

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