Quatro olhares sobre o futuro de Timor-Leste

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Em visita recente a Timor-Leste, o secretário-geral da ONU enfatizou que o mundo tem muito a aprender com a nação asiática. António Guterres disse que após vencer a batalha da independência e da democracia, o país precisa vencer a “batalha do desenvolvimento”.

Em entrevista para a ONU News, o atual primeiro-ministro, Xanana Gusmão, que emergiu como líder do movimento de resistência timorense no período de ocupação indonésia, de 1975 a 1999, ressaltou as dificuldades que o país enfrentou após a independência.

“Conflito nunca mais”

“Já às portas de receber a soberania, o Estado, cheguei à conclusão de que fizemos tudo para ganhar a guerra, mas nunca pensamos em nos prepararmos para a independência. Então foi difícil. Os cinco primeiros anos foram muito difíceis, mais ainda porque não havia dinheiro e íamos pedindo esmolas aqui e esmolas ali. Até que, pouco a pouco, a partir de 2005, começamos a receber algum dinheiro do petróleo”.

A autodeterminação de Timor-Leste foi afirmada por meio de um referendo organizado palas Nações Unidas em 1999, com ampla participação popular. No entanto, a decisão de 78,5% dos votantes, que escolheram a independência, foi confrontada com uma onda de violência desencadeada por milícias pró-Indonésia.

Segundo Gusmão, essa e outras formas de divisionismo perduraram na sociedade timorense e geraram conflitos até 2007. Ele disse que a partir desse momento surgiu o lema “conflito nunca mais, bem-vindo o desenvolvimento”.

Primeiro-ministro timorense, Xanana Gusmão, disse que o movimento pela independência contava com frentes militares, políticas e diplomáticas
ONU News

Primeiro-ministro timorense, Xanana Gusmão, disse que o movimento pela independência contava com frentes militares, políticas e diplomáticas

Dependência do petróleo e transição energética

Em conversa com a ONU News, o presidente José Ramos Horta explicou que os recursos do petróleo e gás foram investidos em um fundo soberano e em mais de mil carteiras de portfólios no mercado financeiro internacional. Segundo ele, esse dinheiro financiou infraestruturas como eletricidade para cerca de 97% do território, estradas e serviços gratuitos de saúde e educação.

Ramos Horta enfatizou que embora seja dependente da receita dos combustíveis fósseis, Timor-Leste está buscando caminhos para uma transição energética justa.

“Pouco e pouco, por exemplo, dentro de algum tempo, Timor-Leste vai assinar com o Japão, com a França, um grande projeto de energia solar, ali na região de Manatuto precisamente. E vai ser um projeto de mais de US$ 100 milhões, nesse processo, dessa estratégia de transição gradual, pragmática e inteligente para energia renovável”.

Para o presidente, Timor-Leste avançou em áreas como criação de universidades aumento do número de médicos, de 21 em 2002 para 1,3 mil em 2024, e melhora da expectativa de vida, que subiu de 57 anos para 70 no mesmo período.

Por outro lado, ele afirmou que considera a pobreza e a subnutrição infantil no país “inaceitáveis”, dada a disponibilidade de dinheiro. Ramos Horta reconheceu que “algo falhou na planificação e execução dos programas”.

Diretora da ONG Arcoiris e assessora da Presidência de Timor-Leste, Bella Galhos
Unifeed/Jorge Rodriguez

Diretora da ONG Arcoiris e assessora da Presidência de Timor-Leste, Bella Galhos

Desenvolvimento para as comunidades

Para a coordenadora residente da ONU, Funmi Balogun, o país tem três grandes desafios. O primeiro é reformar o setor público para que se torne mais eficaz na entrega de serviços para a população.

O segundo é em relação a desafios temáticos, como insegurança alimentar, escassez de água e vulnerabilidade a mudanças climáticas, especialmente inundações e secas. Para Funmi, o desafio da desnutrição tem a ver com a produção, mas também com o acesso a alimentos, dificultado pela geografia montanhosa do país.

Para ela, as comunidades precisam estar mais integradas nas cadeias produtivas e a agricultura precisa ser encarada como fonte de renda e empregos.

A representante da ONU apontou como terceiro desafio o financiamento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, dizendo que os recursos do petróleo, embora financiem o Estado, não são suficientes para as transformações necessárias.

Coordenadora residente da ONU em Timor-Leste, Funmi Balogun
Unifeed/Jorge Rodriguez

Coordenadora residente da ONU em Timor-Leste, Funmi Balogun

Transição da liderança para os jovens

A ativista Bella Galhos, que é assessora do presidente, ressaltou que mais de 40% da população ainda se esforça para fazer três refeições por dia, ter acesso a água limpa, educação de qualidade e serviços adequados de saúde.

Outro problema apontado pela ativista é fato de a violência contra a mulher ser “muito enraizada” em Timor-Leste e estar crescendo. Bella afirma que apesar de haver uma lei para combater a violência doméstica a “implementação não é feita de forma séria”. Segundo ela, que é diretora da ONG Arcoiris, as agressões também ocorrem contra pessoas com deficiência e contra a comunidade Lgbtqia+.

A assessora da Presidência afirma que a grande prioridade no país deveria ser a integração de jovens líderes no processo de desenvolvimento nacional. De acordo com ela, “se não passarem a liderança para gerações mais novas nos próximos anos o país não vai chegar a lugar algum.”

Bella, que foi da geração que lutou pela independência e levou para o mundo sua experiência enquanto sobrevivente de massacres, disse que é hora de libertar os timorenses da pobreza, analfabetismo, desemprego e doenças.

Ela afirmou que após ratificar a maioria das convenções da ONU, sobre diversos temas, está na hora de Timor-Leste focar em fazer “o dever de casa”.

Fonte: ONU

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