A industrialização e o Investimento Privado em Moçambique
A industrialização e o Investimento Privado em Moçambique
A industrialização e o Investimento Privado em Moçambique
Por: Osmane Nalá
A industrialização em Moçambique é um processo histórico e complexo, que envolve diversos factores políticos, económicos, sociais e culturais. A industrialização do país começou no período colonial, com a exploração dos recursos naturais e a instalação de algumas indústrias de base, como o açúcar, o algodão e o tabaco. No entanto, essa industrialização foi limitada e dependente dos interesses da metrópole portuguesa, que impedia o desenvolvimento de sectores mais dinâmicos e diversificados.
Após a independência, em 1975, Moçambique enfrentou uma série de desafios para consolidar a sua soberania e promover o seu desenvolvimento económico e social. O país adoptou um modelo socialista de planificação centralizada, que visava a construção de uma economia nacionalizada e auto-suficiente. Nesse contexto, foram criadas várias empresas estatais e cooperativas, que abrangiam os sectores agrícola, industrial, mineiro, energético e de serviços. No entanto, esse modelo enfrentou dificuldades internas e externas, como a falta de infra-estrutura, de recursos humanos qualificados, de tecnologia e de financiamento, além da guerra civil que durou de 1977 a 1992 e da pressão dos organismos internacionais para a adopção de reformas de mercado.
A partir da década de 1980, Moçambique iniciou um processo de liberalização económica e abertura ao capital estrangeiro, que se intensificou após os acordos de paz de 1992. O país passou por um processo de privatização das empresas estatais, de desregulamentação dos mercados, de redução do papel do Estado na economia e de integração regional e global. Esse processo teve impactos positivos e negativos sobre a industrialização do país. Por um lado, houve um aumento do investimento estrangeiro directo, principalmente nos sectores de extracção mineral e energética, que impulsionaram o crescimento económico e a geração de empregos. Por outro lado, houve uma desindustrialização relativa, com o encerramento ou a redução da capacidade produtiva de muitas indústrias nacionais, que não conseguiram competir com os produtos importados ou se adequar às exigências dos mercados internacionais. Além disso, houve uma concentração da produção industrial em poucos sectores e regiões do país, aumentando as desigualdades regionais e sociais.
A gestão sustentável dos recursos naturais requer políticas soberanas do país que envolvam a propriedade, a distribuição e a aplicação das receitas geradas pelos projectos de exploração. Além disso, é preciso que haja instituições fortes e capazes de enfrentar os desafios macroeconómicos, fiscais e de investimento público, bem como a participação de todos os actores relevantes, desde o governo até as comunidades locais, passando pelas empresas e pela sociedade civil. Outro aspecto importante é a realização de uma avaliação rigorosa e independente dos custos e benefícios dos projectos, que considere as alternativas possíveis e as medidas de mitigação ou compensação adequadas. Por fim, é essencial que haja um acompanhamento contínuo e uma fiscalização efectiva dos projectos, que garanta o cumprimento das normas legais e éticas, bem como o respeito pelos direitos humanos e pelo ambiente.
Portanto, é necessário incentivar uma política industrial que promova a inovação tecnológica, a qualificação profissional, a melhoria da infra-estrutura física e institucional, o cuidado com o meio ambiente e a inserção competitiva nos mercados regionais e globais. Para isso, é fundamental que os actores económicos locais, como os pequenos e médios empresários, os trabalhadores e as entidades sociais, se envolvam na elaboração e na execução das medidas de apoio à indústria nacional. Além disso, é essencial estimular a participação dos agentes económicos locais, como os pequenos e médios empreendedores, os trabalhadores e as organizações sociais, na elaboração e na execução das estratégias adequadas à sua realidade. Essas estratégias podem envolver a introdução de capital externo ou a utilização de recursos locais, dependendo do estágio e da condição da indústria regional. O importante é produzir produtos e serviços com valor agregado e competitividade, aproveitando as potencialidades e as oportunidades de cada região.
Diante deste cenário, Moçambique tem o desafio de promover uma industrialização mais inclusiva e sustentável, que contribua para a diversificação da sua estrutura produtiva, para a agregação de valor aos seus recursos naturais, para a geração de empregos qualificados e para a redução da pobreza e das vulnerabilidades. Para isso, é preciso fortalecer as políticas públicas de apoio à inovação tecnológica, à formação profissional, à infra-estrutura física e institucional, à protecção ambiental e à integração regional e global.
Recorrendo a Megaprojectos, Moçambique tem beneficiado de grandes investimentos estrangeiros nos sectores de energia, mineração, agricultura e infra-estrutura, uma fonte que tem contribuído para o crescimento económico e social, geração de emprego e a arrecadação fiscal do país. Alguns exemplos de megaprojectos em Moçambique são a fundição de alumínio Mozal, os projectos de gás de Temane em Inhambane e o projecto de minério de titânio e areias pesadas de Moma em Nampula.
No entanto, a industrialização baseada nos megaprojectos também apresenta desafios e riscos, no desenvolvimento sustentável e inclusivo, como a dependência externa, a desigualdade regional, fragilidade institucional os impactos ambientais e sociais negativos. Para a mitigação de tais factores, é necessário que se adoptem políticas públicas que garantam a sustentabilidade e a inclusão da industrialização, bem como a diversificação da economia e a integração regional.
Os megaprojectos podem ter um impacto positivo na economia e na sociedade, se forem bem planeados e integrados com o tecido produtivo local. Isso significa que devem procurar estabelecer relações de parceria com os fornecedores locais, que são as empresas que oferecem serviços ou produtos. Essas relações podem trazer benefícios mútuos, como oportunidades de negócios, transferência de conhecimento e tecnologia, capacitação de recursos humanos e diversificação da economia local. Para que isso seja possível, é necessário que os mesmos adoptem políticas e práticas de contratação local, que os fornecedores locais sejam competitivos e qualificados, e que haja um ambiente favorável à cooperação entre os diferentes actores envolvidos.
Uma questão importante na análise do desenvolvimento industrial é o papel das empresas que operam a montante da cadeia produtiva, ou seja, aquelas que fornecem bens e serviços para outras indústrias. Estas empresas podem ter um impacto significativo na dinâmica e na estrutura do tecido industrial do país ou região, especialmente se estiverem envolvidas em grandes projectos de infra-estrutura, energia, mineração ou exploração de recursos naturais. No entanto, os padrões na evolução destas empresas sustentam o argumento que crescimento das empresas ligadas a montante com grandes projectos não necessariamente conduz a industrialização. Pelo contrário, pode haver um efeito de desindustrialização, se as empresas a montante não forem capazes de gerar encadeamentos produtivos com as indústrias a jusante, ou seja, aquelas que utilizam os bens e serviços fornecidos pelas primeiras. Neste artigo, abordam-se os principais factores que influenciam a relação entre as empresas a montante e a industrialização, e apresentamos alguns exemplos de casos em que esta relação foi positiva ou negativa.
O investimento privado em Moçambique tem apresentado tendências e padrões que reflectem as características da economia extractiva do país. A maior parte do investimento provém de fontes externas, principalmente do investimento directo estrangeiro (IDE) e dos empréstimos externos, que se concentram na exploração de recursos naturais, como os minerais, óleo e gás, e a energia. Esses investimentos têm poucas ligações produtivas com os demais sectores da economia nacional, limitando a criação, a diversificação e a articulação de capacidades industriais. A agricultura e a indústria, que poderiam contribuir para o desenvolvimento de uma base produtiva mais diversificada e integrada, recebem uma parcela menor do investimento privado, e enfrentam desafios como a falta de infra-estrutura, a concorrência desleal e a instabilidade cambial. É necessário repensar o papel do investimento privado na estratégia de desenvolvimento nacional, buscando formas de promover uma maior inclusão produtiva e social, bem como uma melhor distribuição dos benefícios gerados pela exploração dos recursos naturais.
A participação num megaprojecto de grande escala pode trazer benefícios económicos e sociais imediatos para uma região ou um país, mas não significa necessariamente que haja um desenvolvimento sustentável a longo prazo. Para que isso aconteça, é preciso que haja uma boa gestão dos recursos naturais, uma distribuição equitativa dos rendimentos, uma diversificação das actividades produtivas e uma protecção do ambiente. Caso contrário, o megaprojecto pode tornar-se numa fonte de dependência, de desigualdade e de degradação ambiental.
Uma das questões mais debatidas na literatura sobre investimento directo estrangeiro (IDE) é o seu impacto no desenvolvimento das empresas locais. Alguns autores defendem que o IDE pode estimular a transferência de tecnologia, o aumento da produtividade e a criação de emprego nas economias receptoras. Outros argumentam que o IDE pode deslocar ou desencorajar as empresas locais, reduzir a sua competitividade e limitar as suas oportunidades de crescimento. Neste contexto, é importante analisar o tipo e a qualidade das ligações entre as empresas estrangeiras e as empresas locais, bem como os factores que influenciam a sua formação e evolução.
Um aspecto que tem recebido pouca atenção é o papel dos grandes projectos de IDE, especialmente nos sectores de recursos naturais, infra-estruturas e indústrias pesadas. Estes projectos envolvem elevados montantes de capital, longos períodos de maturação e elevados requisitos técnicos e ambientais. Estes projectos podem ter um impacto significativo na economia do país receptor, tanto directa como indirectamente, através das suas ligações com as empresas locais. No entanto, estas ligações não são automáticas nem garantidas. Muitas vezes, os grandes projectos de IDE operam em regime de enclave, com pouca interacção com o tecido empresarial local. Isto pode dever-se a vários factores, tais como a falta de capacidade ou qualidade das empresas locais, as barreiras regulatórias ou institucionais, ou a falta de incentivos ou mecanismos para promover a cooperação entre as partes.
Neste sentido, é fundamental compreender como se podem fortalecer e diversificar as ligações entre os grandes projectos de IDE e as empresas locais, de forma a maximizar os seus potenciais benefícios para o desenvolvimento económico e social do país receptor. Para isso, é necessário analisar as características e os desafios específicos destes projectos, bem como as políticas e as boas práticas que podem facilitar a sua integração na economia local.
Um dos principais problemas dos megaprojectos é que eles tendem a concentrar os recursos e as oportunidades numa só região ou sector, criando desequilíbrios e dependências que podem comprometer a diversificação económica e a inclusão social. Por exemplo, um projecto de exploração de gás natural pode gerar receitas e empregos para o país, mas também pode aumentar a vulnerabilidade a choques externos, como a flutuação dos preços internacionais ou a escassez de recursos. Além disso, se o projecto não for bem planeado e gerido, pode excluir as comunidades locais dos benefícios, provocando conflitos, deslocamentos forçados ou violações dos direitos humanos.
Outro problema é que os megaprojectos podem ter efeitos negativos sobre o ambiente e o clima, que podem comprometer a qualidade de vida das gerações presentes e futuras. Por exemplo, uma barragem hidroeléctrica pode fornecer energia limpa e renovável para o país, mas também pode alterar o regime hidrológico e ecológico do rio, afectando a biodiversidade, os serviços ecos sistémicos e os meios de subsistência das populações ribeirinhas. Além disso, se o projecto não for bem avaliado e monitorizado, pode contribuir para a emissão de gases de efeito estufa ou para a contaminação da água e do solo.
Para isso, é necessário que haja uma boa governança dos recursos naturais, que envolva todos os actores relevantes, desde o governo até às comunidades locais, passando pelas empresas e pela sociedade civil. Também é necessário que haja uma avaliação rigorosa e independente dos custos e benefícios dos projectos, que considere as alternativas possíveis e as medidas de mitigação ou compensação adequadas. Por fim, é necessário que haja um acompanhamento contínuo e uma fiscalização efectiva dos projectos, que garanta o cumprimento das normas legais e éticas, bem como o respeito pelos direitos humanos e pelo ambiente.
A industrialização do país depende das ligações das empresas com os megaprojectos?
Essa é uma questão que envolve diversos aspectos económicos, sociais e ambientais. A industrialização é um processo de transformação de matérias-primas em mercadorias ou bens de produção, que implica o uso de máquinas, trabalho e capital. A industrialização pode trazer benefícios como o aumento da produção, da renda, do emprego e do comércio, mas também pode gerar problemas como a poluição, a desigualdade, a exploração e o esgotamento dos recursos naturais.
As empresas ligadas a grandes projectos, especialmente os de investimento estrangeiro directo (IED), podem ter um papel importante na industrialização do país como um todo ou uma região em particular, pois podem criar demanda por bens e serviços locais, transferir tecnologia e conhecimento, estimular a inovação e a competitividade e gerar encadeamentos produtivos. No entanto, essas ligações não são automáticas nem garantidas, pois dependem de vários factores, como as características dos projectos, das empresas locais, do mercado e das políticas públicas.
Um exemplo de país que tem buscado promover a industrialização por meio das ligações com grandes projectos é Moçambique, onde há uma forte presença de megaprojectos de IED no sector de mineração, petróleo e Gás, e energia. Um estudo realizado pelo Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE) e pela Fundação para o Avanço da Ciência (FAN) analisou as ligações entre os grandes projectos de IED e os fornecedores locais em Moçambique, com foco na Mozal, uma empresa de fundição de alumínio que iniciou suas operações em 2000.
O estudo concluiu que as ligações entre os grandes projectos de IED e as empresas locais são limitadas pelo carácter afunilado da economia moçambicana, que é dominada pela exportação de produtos primários e tem um mercado doméstico pequeno, fragmentado e de baixa qualidade. Além disso, o estudo constatou que o crescimento das empresas ligadas com os grandes projectos não necessariamente conduz a industrialização, pois muitas delas se especializam em actividades de baixo valor agregado, como transporte, construção e serviços gerais, e não desenvolvem capacidades industriais mais complexas e diversificadas.
Uma das questões que se coloca no debate sobre o desenvolvimento económico de Moçambique é se o crescimento das empresas ligadas com os grandes projectos de investimento directo estrangeiro (IDE) conduz ou não à industrialização do país. Alguns autores defendem que as ligações a montante com os megaprojectos de IDE representam uma oportunidade de diversificação e articulação da base produtiva, bem como de transferência de tecnologia e capacitação das empresas nacionais. Outros autores, porém, argumentam que as ligações com os grandes projectos de IDE são limitadas e não geram dinâmicas suficientes para a industrialização, pois tendem a reproduzir o carácter afunilado e dependente de dinâmicas externas da economia moçambicana.
Portanto, pode-se afirmar que o crescimento das empresas ligadas com grandes projectos não é suficiente para garantir a industrialização do país ou região. É preciso que haja uma estratégia de desenvolvimento que articule os interesses dos diferentes actores envolvidos, que incentive a diversificação e a integração da base produtiva e comercial, que promova a qualidade e a sustentabilidade dos processos produtivos e que fortaleça as instituições e as políticas públicas voltadas para o fomento da actividade industrial.
Um estudo recente realizado por Epifânia Langa e Oksana Mandlate, do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), analisou a experiência de 16 empresas nacionais que fornecem bens e serviços à Mozal, o primeiro grande projecto de IDE em Moçambique, instalado em 1998. A Mozal é uma fábrica de alumínio que opera com tecnologia avançada e elevados padrões de qualidade, segurança e gestão. O estudo procurou responder à seguinte pergunta: em que medida as ligações a montante com a Mozal permitem criar, diversificar e articular capacidades industriais dentro da economia?
Os resultados do estudo mostram que as ligações com a Mozal por si só não fornecem uma base ampla para o desenvolvimento das empresas nacionais, pois as possibilidades reais de ligações são limitadas pelo carácter afunilado da economia e pelos padrões dualistas do mercado. Além disso, o crescimento das empresas ligadas com a Mozal não necessariamente conduz à industrialização, pois as empresas não seguem uma estratégia de acumulação de capacidades industriais para sustentar o seu crescimento, mas sim uma estratégia de diversificação para as actividades que permitem explorar as oportunidades de receitas junto dos grandes projectos de IDE. Assim, as ligações com a Mozal tendem a reforçar o padrão de crescimento que é ineficaz em reduzir a pobreza e em promover a transformação estrutural da economia.
O estudo conclui que as ligações com os grandes projectos de IDE não são suficientes para induzir a industrialização, sendo necessário criar dinâmicas alternativas que estimulem a inovação, a competitividade e a integração das empresas nacionais nos mercados internos e externos. Para isso, é preciso adoptar políticas públicas que favoreçam o desenvolvimento do sector privado nacional, tais como: melhorar o ambiente de negócios, facilitar o acesso ao crédito, à energia e às infra-estruturas; apoiar a formação profissional e técnica; incentivar a cooperação entre as empresas; e regular os grandes projectos de IDE para garantir que eles contribuam efectivamente para o desenvolvimento nacional.