António Morgado, o flamengo forçado

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[imgep]

Aos 20 anos, na primeira temporada no topo do ciclismo, o corredor português da UAE Emirates encanta nas clássicas belgas do WorldTour. Na terça-feira roçou a vitória na La Samyn. Mesmo sem gostar de corridas no ‘pavé’

António Morgado não tem demorado a sobressair entre grandes e consagrados do ciclismo mundial. Jovem prodígio augurado por esmagador domínio nos escalões etários inferiores do ciclismo português, confirmou-se logo que se internacionalizou, roçando os títulos mundiais de fundo de juniores e de sub-23 em anos consecutivos (2022-23). O primeiro vice valeu-lhe a transferência para a equipa mais prestigiada do planeta na formação de grandes corredores, a norte-americana Continental, Hagens Berman Axeon, e o segundo, a contratação pela n.º 1 do ranking mundial, a todo-poderosa UAE Emirates, de Tadej Pogacar e do seu compatriota João Almeida – além dos também portugueses Rui e Ivo Oliveira.

Em 2024, na sua primeira época no WorldTour, integrado numa equipa tão competitiva, não se previa que António Morgado, de tenros 20 anos completados a 28 de janeiro, fosse lançado às feras pelos responsáveis do conjunto dos Emirados. Não tão cedo. E tem correspondido. Mais: tem excedido a expectativas. Mesmo as de quem, conhecendo-o, sem desmedido otimismo as colocavam altas. O natural de Salir do Porto não demorou a confirmar talento e versatilidade enormes.

O português estreou-se logo na primeira corrida do WorldTour de 2024, o Tour Down Under, na Austrália, país de que guarda recordações agridoces, onde em 2022, em Wollongong, foi vice-campeão mundial de juniores. Foram seis dias de ambientação ao pelotão mundial, o quanto baste para um ciclista-camaleão como Morgado. Ficou na sombra do companheiro de equipa Isaac del Toro, mexicano e igualmente campeão prometido, vencedor da Volta a França do Futuro em 2023, que ganhou uma etapa, deixando o mundo do ciclismo de queixo caído.

Depois do arranque, Morgado não mais parou. Veio a Portugal para a Figueira Champions Classics e aí começou a dar nas vistas com o 15.ª lugar, terminando a prova no grupo de perseguição ao irresistível Remco Evenepoel, depois de não se ter poupado a esforços na tentativa infrutífera de alcançar o jovem belga, referência máxima de precocidade do ciclismo atual, o melhor exemplo para geração de António Morgado.

Da Figueira da Foz para a Volta ao Algarve, mais um patamar galgado na exigência competitiva e mais uma resposta a preceito do corredor português. Outra vez a acima das expectativas. Décimo lugar, o melhor do nosso país e o melhor da sua ilustre equipa, cujos diretores desportivos embeveceram-se com a estoicidade do novo recruta – e que após cinco dias de esforço não o pouparam, lançando-o nas duras e clássicas flamengas de piso empedrado.

No último sábado, a primeira, a prestigiada Omloop Het Nieuwsblad, entre uma elite de classicómanos. Morgado não se acanhou e concluiu a prova na 25.ª posição, outra vez no grupo principal, a oito segundos do vencedor, Jan Tratnik (Visma), e depois de muito ter trabalhado para o seu colega alemão Nils Politt, batido por aquele esloveno sobre a meta.

Sem descanso, no dia seguinte, apresentou-se na segunda clássica do denominado Fim de Semana de Abertura, a Kuurne-Bruxelas-Kuurne, e nem assim aliviou os pedais. Mais uma vez, liderou o pelotão em várias ocasiões, contribuindo para outro companheiro na UAE Emirates, o belga Tim Wellens, ter discutido o triunfo com a estrela Wout van Aert. Perdeu. Morgado foi 48.º, a 37 segundos do principal pelotão, de onde se deixou descair depois de cumprir, com competência, a tarefa em prol do coletivo.

Dois dias depois, António outra vez em ação. Ontem, ainda na Bélgica, agora numa semi-clássica, Le Samyn. Mais pisos empedrados, mais batalhas. Após 204 quilómetros em alta intensidade, o português deparou-se num grupo de 25 unidades que disputariam a vitória num longo sprint. Morgado não é velocista. De todo. Mas pelos vistos é de tudo um pouco. E bem. Lançou-se de trás, recuperou como um foguete, e quando certamente acreditou que poderia ganhar, atirou a bicicleta para a frente sobre a linha de meta, que cruzou lado a lado com um especialista nestas chegadas explosivas, o belga Laurenz Rex (Intermarché-Wanty). Foi necessário recorrer a photo-finish para determinar o vencedor. Não foi Morgado, por centímetros. Mas o jovem, segundo classificado, não se frustrou.

«A sensação é boa, porque fiquei perto da vitória novamente. É um segundo lugar, mas estou muito satisfeito. Estou mesmo muito feliz com a forma como as coisas me correram nas últimas provas», declarou após a competição.

Em seguida, solta-se-lhe a singeleza própria da juventude. «Se gosto destas clássicas? Não gosto! De empedrados, também não. E ainda menos de corridas muito planas e com final ao sprint», dispara. «Paralelos (pavé) não são a minha praia. Gosto quando o percurso é mais difícil, mais duro, com muitas subidas. Mas, enfim, foi bom, foi divertido», acrescentou o português, que finalmente terá quase 15 dias sem competições, regressando ao ativo a 13 de março para mais clássicas. A primeira em França, o Grande Prémio de Denan – Porte du Hainaut, antes de voltar à Bélgica para um périplo que incluirá a célebre Gent-Wevelgem e culminará no primeiro monumento do WorldTour da sua ainda tão curta carreira, a Volta a Flandres, em 31 de março.

Voltando à La Samyn. «Havia um troço difícil de empedrado a dois quilómetros do final, que os deixou [aos adversários] cansados. Por isso é que decidi dar tudo no sprint», contou ainda António Morgado, que terá de ser paciente, pois a UAE Emirates quere-o em quase todas as clássicas de pavé, incluindo a mítica Paris-Roubaix, a 7 de abril. Quem sabe se António Morgado não lhe toma o gosto… pelo bom sabor da vitória.

Fonte: A Bola

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