O sector aéreo moçambicano enfrenta uma nova turbulência. A Emirates Airlines, uma das maiores companhias aéreas do mundo, anunciou a suspensão imediata de sua parceria de interline com a LAM – Linhas Aéreas de Moçambique. A decisão, amplamente interpretada como um duro golpe para a reputação e viabilidade da transportadora moçambicana, decorre da suspensão da LAM pela Câmara de Compensação da IATA (IATA Clearing House – ICH), devido à falta de pagamento das suas obrigações financeiras.
A IATA Clearing House (ICH), que gere a compensação de pagamentos entre companhias aéreas, suspendeu a LAM por inadimplência. Este detalhe é fundamental para entender a gravidade da situação: a suspensão não só impossibilita a continuidade de parcerias cruciais, como a da Emirates, mas também compromete a confiança internacional na transportadora moçambicana. O não pagamento de dívidas à ICH é um forte indicativo de dificuldades financeiras profundas, com impactos directos nas operações e na capacidade da LAM de manter acordos globais.
A crise em números
A notificação da Emirates foi clara e inequívoca: a partir de 16 de Outubro de 2024, qualquer bilhete da LAM (TM) já emitido ou com planos de ser utilizado através da rede Emirates será cancelado. Os passageiros que compraram bilhetes da Emirates, mas que utilizariam voos da LAM, serão reencaminhados para outras companhias aéreas regionais, como a Airlink, Cemair e Ethiopian Airlines, em reservas involuntárias na classe mais baixa disponível. Se essas opções não estiverem disponíveis, os clientes podem solicitar reembolsos, o que aumenta a pressão financeira sobre a LAM.
Este anúncio sinaliza um alerta vermelho para a saúde financeira da LAM, uma empresa que já atravessava anos de dificuldades. A dívida crescente, a redução de frequências de voos e a diminuição de serviços têm corroído a sua capacidade de competir em um setor já fragilizado pela pandemia de COVID-19 e pelo aumento dos custos operacionais.
Assim, o clavário da LAM parece não ter fim a vista
Impactos imediatos e futuras repercussões
A decisão da Emirates vai muito além de uma simples questão administrativa. As consequências dessa ruptura podem ser profundas e duradouras para o sector aéreo moçambicano e para a economia do País como um todo.
Em primeiro lugar, há a perda de conectividade internacional. Sem o apoio de parcerias com grandes companhias aéreas, como a Emirates, a LAM verá sua capacidade de conectar Moçambique com o resto do mundo ainda mais limitada. Para um país com uma economia cada vez mais integrada com mercados internacionais — especialmente no sector de petróleo e gás — a falta de conectividade aérea pode se traduzir em dificuldades logísticas e aumento dos custos operacionais para investidores e empresas.
Além disso, a imagem e a confiança da LAM também estão em jogo. A suspensão por falta de pagamento à IATA é um sinal claro de dificuldades financeiras profundas. A confiança dos parceiros internacionais e dos clientes na LAM já estava abalada, mas esse incidente reforça a percepção de uma empresa que enfrenta desafios estruturais graves. Companhias internacionais podem hesitar em estabelecer ou manter laços com a LAM, temendo um colapso futuro.
A pressão sobre o governo moçambicano também aumenta. Como accionista principal da LAM, o Governo de Moçambique enfrenta agora um dilema difícil. A empresa, que já tem um histórico de receber apoios financeiros públicos, pode exigir novas intervenções. No entanto, com o Estado já pressionado por questões de dívida pública e gestão de recursos, surge a questão de até onde o Governo estará disposto a ir para salvar a transportadora nacional.
Outro aspecto crítico é o impacto no turismo e no comércio. A queda de conectividade aérea afecta directamente o turismo, uma das principais fontes de receita de Moçambique. Hotéis, operadores turísticos e pequenas empresas dependem de uma rede aérea funcional para atrair visitantes. Além disso, o comércio internacional, especialmente no sector de importação e exportação, também pode ser afectado pela redução das opções de transporte aéreo.
O Fim de uma Era?
A suspensão das parcerias de interline pela Emirates pode ser vista como um reflexo de uma crise sistêmica dentro da LAM. Enquanto outras transportadoras africanas, como a Ethiopian Airlines, têm explorado estratégias de expansão, a LAM parece estar a perder terreno rapidamente, incapaz de se ajustar à dinâmica de um sector global cada vez mais competitivo. A incapacidade de cumprir com as obrigações financeiras é um sinal claro de que a LAM está a operar em uma situação de vulnerabilidade extrema. Se não houver uma intervenção rápida e decisiva para reverter essa trajectória, a transportadora nacional de Moçambique corre o risco de entrar numa espiral de insolvência que poderá ser irreversível.
Existe um caminho para a recuperação?
Embora a situação pareça grave, ainda há esperança para a LAM, desde que haja uma reestruturação profunda e bem orientada. O Governo e os gestores da empresa devem olhar para além do resgate financeiro de curto prazo e considerar parcerias estratégicas com outras companhias aéreas ou investidores internacionais, que possam trazer não só capital, mas também a expertise necessária para revitalizar a empresa.
O futuro da LAM depende da sua capacidade de se reinventar. E para isso, será necessária uma liderança firme, coragem para tomar decisões difíceis e a capacidade de restaurar a confiança do mercado. A suspensão da parceria com a Emirates e a interrupção na IATA Clearing House marcam o início de uma nova fase — seja de recuperação ou de declínio — na história da aviação em Moçambique.
Fonte: O Económico