Revista Tempo

Economia moçambicana cresce 4,5%: Entre desafios e oportunidades de transformação

A economia moçambicana registou um crescimento de 4,5% no segundo trimestre de 2024, de acordo com os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE). Este desempenho reflecte uma recuperação após anos de desafios, impulsionada pelos sectores dos transportes, comunicações, indústria extractiva e serviços. Contudo, apesar deste progresso, o país enfrenta obstáculos estruturais que podem limitar o seu potencial de crescimento sustentável. O economista-chefe do Banco Mundial para África, Andrew Dabalen, numa recente entrevista ao “Semanário Económico”, sublinhou os desafios que a África Subsariana, incluindo Moçambique, enfrenta, reforçando a necessidade de reformas estruturais para promover um crescimento mais equitativo e resiliente.

Sectores dinâmicos e oportunidades de crescimento

O sector dos transportes e comunicações foi um dos principais motores deste crescimento económico, beneficiando dos investimentos em infra-estruturas, como os corredores de Nacala e Beira. A movimentação de mercadorias e o comércio interno aumentaram, impulsionados por melhorias logísticas. Este sector apresenta uma oportunidade significativa para o futuro, com a continuação dos investimentos em infra-estruturas e o desenvolvimento de corredores regionais que podem ampliar o papel de Moçambique como um importante eixo de transporte na África Austral.

Outro pilar do crescimento foi a indústria extractiva, com destaque para a exploração de gás natural e minerais. O relançamento de projectos de gás natural liquefeito (GNL), como os liderados pela TotalEnergies, tem sido crucial para impulsionar o crescimento. Estes projectos não só aumentam as exportações, como também atraem investimento estrangeiro directo, consolidando Moçambique como um dos principais produtores de energia na região. “O crescimento económico na África Subsariana é insuficiente para reduzir significativamente a pobreza”, afirmou Andrew Dabalen, ao destacar que, embora sectores como o gás e a mineração sejam fundamentais, o crescimento precisa de ser mais inclusivo para beneficiar a população em geral.

O sector dos serviços, em especial o comércio e o turismo, também contribuiu para a recuperação. Com a flexibilização das restrições pandémicas, o turismo tem vindo a aumentar, especialmente em destinos costeiros como Pemba e Vilanculos. Contudo, como sublinhou Dabalen, o ritmo de expansão económica na região, embora positivo, “permanece abaixo da taxa de crescimento da década anterior (2000-2014)”, sugerindo que é necessário um crescimento mais robusto e diversificado para que os benefícios económicos cheguem às populações mais vulneráveis.

Desafios estruturais: Inflação, dívida e desigualdade

Apesar do crescimento registado, Moçambique, à semelhança de outras economias da África Subsariana, continua a enfrentar desafios profundos, particularmente no que diz respeito à inflação e à sustentabilidade da dívida pública. De acordo com Andrew Dabalen, “mais de metade dos países da África Subsariana enfrenta encargos insustentáveis com a dívida”. Este cenário também se aplica a Moçambique, onde a dívida pública e o serviço da dívida consomem uma parte significativa das receitas do governo, restringindo a capacidade de investimento em sectores essenciais, como a educação e a saúde.

A inflação continua elevada, afectando o poder de compra das famílias moçambicanas e dificultando o crescimento do consumo interno, que é um motor crucial para o desenvolvimento económico. Embora a inflação esteja a arrefecer, Dabalen sublinha que esta “permanece elevada em comparação com os níveis anteriores à pandemia”, o que limita o impacto positivo do crescimento económico no bem-estar das populações.

Outro desafio é a persistente desigualdade estrutural, que impede que o crescimento económico se traduza numa melhoria substancial das condições de vida para a maioria da população. “O crescimento económico reduz a pobreza na África Subsariana menos do que noutras regiões”, observou Dabalen, destacando que um aumento de 1% no PIB per capita na região resulta apenas numa redução de 1% na taxa de pobreza extrema, em comparação com uma redução de 2,5% noutras partes do mundo. Esta realidade destaca a necessidade urgente de políticas que abordem as desigualdades e garantam que o crescimento seja mais equitativo.

Oportunidades e o papel das reformas estruturais

Apesar destes desafios, Moçambique tem um potencial considerável para transformar a sua economia. O sector do gás natural, em particular, oferece uma oportunidade única de gerar receitas substanciais, atrair investimento estrangeiro e criar empregos. No entanto, como alertou Dabalen, para que este potencial seja totalmente realizado, o País precisa de “restaurar a estabilidade macroeconómica e promover a mobilidade intergeracional”. Isso implica a criação de um ambiente de negócios favorável, a implementação de reformas fiscais que não sobrecarreguem as populações mais pobres, e o fortalecimento das instituições públicas para garantir uma governança mais eficaz.

 

A diversificação da economia é outro elemento crucial. O agroprocessamento, por exemplo, apresenta um grande potencial para reduzir a dependência das importações e aumentar as exportações de produtos com valor acrescentado. Investir em infra-estruturas de apoio à agricultura e em tecnologias de produção pode ajudar a transformar este sector num motor de crescimento.

Além disso, a comunidade internacional pode desempenhar um papel importante no apoio ao desenvolvimento de Moçambique, fornecendo “mais financiamentos em condições favoráveis para facilitar a execução das reformas estruturais”, como destacou Dabalen. A gestão da dívida externa e o acesso a financiamento concessionário serão cruciais para libertar recursos que podem ser canalizados para áreas prioritárias, como o combate à pobreza e a promoção da inclusão social.

O crescimento de 4,5% no segundo trimestre de 2024 representa uma recuperação encorajadora para Moçambique, mas o caminho para um desenvolvimento económico sustentável continua repleto de desafios. A inflação elevada, o peso da dívida pública e as profundas desigualdades estruturais são barreiras que precisam de ser superadas. Como sublinhou Andrew Dabalen, “os governos africanos têm de combater a desigualdade estrutural para promover um crescimento mais forte e mais equitativo”. 

No entanto, com uma abordagem estratégica que inclua reformas estruturais, diversificação económica e a criação de um ambiente de negócios mais inclusivo, Moçambique tem a oportunidade de capitalizar o seu potencial e alcançar um crescimento que beneficie todos os seus cidadãos.

Fonte: O Económico

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