Revista Tempo

Em meio à violência e fome, ONU encoraja caminho para fim da crise política no Haiti

Um grupo de deslocados hospedados em uma escola no centro de Porto Príncipe, Haiti

O secretário-geral da ONU, António Guterres, reconheceu que passos importantes foram tomados para “resolver a crise política do Haiti”, ao se referir ao acordo alcançado na segunda-feira para a criação de um Conselho Presidencial e a nomeação de um primeiro-ministro interino como medidas transitórias.  

O atual primeiro-ministro haitiano, Ariel Henry, anunciou que renunciaria imediatamente após a instalação do Conselho de Transição.

Acordo para restaurar a democracia

Em mensagem transmitida por seu porta-voz nesta terça-feira, o líder da ONU apelou para que todas as partes interessadas haitianas “atuem com responsabilidade e tomem medidas para a implementação do acordo, a fim de restaurar a democracia e as instituições do país, através de eleições pacíficas, credíveis, participativas e inclusivas”. 

Guterres afirmou que as Nações Unidas, através da sua missão no país, “continuarão a apoiar o Haiti no seu caminho rumo às eleições”.

O secretário-geral reiterou sua “solidariedade inabalável com o povo do Haiti, que necessita de segurança, abrigo, alimentação e cuidados médicos, e condições para viver suas vidas com dignidade”.

Desnutrição comparável a de zonas de guerra

Também nesta terça-feira, o diretor do Programa Mundial de Alimentos no Haiti, Jean-Martin Bauer, afirmou que as taxas de desnutrição na capital do país são “tão altas quanto aquelas vistas em zonas de guerra”.

Falando a jornalistas de Cape Haitien, ele disse que a explosão de violência no país “está agravando vulnerabilidades pré-existentes”.

O PMA está soando o alarme para o fato de que 4 milhões de pessoas já estão em insegurança alimentar severa, com mais um milhão em risco iminente de fome. 

Segundo Bauer, mais de 15 mil pessoas foram deslocadas na primeira semana de março devido a violência de gangues, aumentando o total de deslocados no país para mais de 360 mil. 

Crianças são levadas pelas mães para exames nutricionais no bairro Delams, em Porto Príncipe
Unicef/Herold Joseph
Crianças são levadas pelas mães para exames nutricionais no bairro Delams, em Porto Príncipe

Bloqueios e aumento do preço dos alimentos

Ele afirmou que a interrupção no fluxo de bens está afetando a disponibilidade de alimentos na capital, pois “as estradas de acesso à Porto Príncipe são controladas por grupos armados” e os serviços aéreos foram interrompidos. No momento, estima-se um total de 100 mil pessoas deslocadas dentro da cidade. 

O especialista alertou ainda que já foi observado um aumento de 10% nos preços da cesta básica de alimentação, adicionalmente a um aumento de 25% que já havia ocorrido em janeiro. Ele considera a situação “extremamente preocupante”, pois a renda das pessoas está em queda devido à impossibilidade de trabalhar em meio à insegurança generalizada.

O PMA possui uma equipe de 300 pessoas que segue trabalhando no Haiti. A agência da ONU tem oferecido refeições quentes diárias para 14 mil pessoas deslocadas, com foco especial naqueles que tiveram que fugir na semana passada. 

Estratégias para garantir assistência alimentar

Para realizar a assistência na capital sitiada, o PMA conta com um armazém que ainda tem estoques que são distribuídos em abrigos e compartilhados com parceiros locais. No entanto, os estoques precisarão ser preenchidos, o que não será possível caso o acesso à Porto Príncipe continue bloqueado.

O PMA revelou que adota no Haiti uma cadeia de abastecimento descentralizada e suprida por produtores locais. Isso permite agilidade para contornar bloqueios em portos e estradas e reduz a dependência de importações. 

Com base no suprimento fornecido por organizações de agricultores haitianos, a agência foi capaz de alimentar 160 mil crianças em escolas nesta segunda-feira. 

Unicef/Herold Joseph
Em Porto Príncipe, capital do Haiti, a escalada da violência tornou-se uma realidade sombria que está deslocando milhares de pessoas

Ajuda humanitária drasticamente desfinanciada

Para apoiar a população necessitada, a agência aposta num pacote de assistência onde dois terços são em dinheiro e um terço em alimentos. Cerca de 60% do apoio financeiro é fornecido por meios digitais, para que as pessoas possam acessar por meio de telefones móveis. 

De acordo com Bauer, é necessário segurança para seguir oferecendo ajuda, mas o foco deve estar também nas ações humanitárias. Ele lamentou que os programas de ajuda estejam “drasticamente desfinanciados” no Haiti. O Plano de Resposta Humanitária da ONU, por exemplo, recebeu apenas 2% do financiamento necessário.

Comentando o potencial envio de uma Missão Multinacional de apoio à Polícia Haitiana, Bauer disse que “apenas botas no terreno não vão resolver o problema”, e que o contexto de instabilidade e deslocamento massivo requer uma resposta forte de assistência alimentar.

Fonte: ONU

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